A classe política nacional acaba de realizar a mais lamentável lesão ao sistema de justiça no Brasil, ao promover a derrubada de dezoito vetos da chamada “lei de abuso de autoridade”. Os parlamentares do Congresso Nacional fizeram manobras às pressas, aprovando a lei em votação simbólica, com o fim de preservar as suas identidades e subtrair do povo até mesmo o direito de saber quem, de fato, votou em seu favor. A lei é tão baixa que, a pretexto de tutelar algo que todos defendem (o combate ao abuso de poder), passa a criminalizar condutas de promotores, juízes e policiais que estejam no exercício pleno e constitucional das suas funções de combate ao crime. A situação passa a ser tão absurda, que corruptos e criminosos se sentirão à vontade, cada vez mais, para continuar na senda delitiva, na medida em que a nova lei foi criada para impor medo e insegurança àqueles que têm a missão de investigar, processar e julgar deliquentes. Passa-se a criminalizar condutas extremamente subjetivas, como “deixar de conceder habeas corpus quando manifestamente cabível”. Pergunto: em que consiste o “manifestamente cabível?”. Vejam que a lei é cheia de expressões vagas e imprecisas, cujo objetivo é justamente atribuir insegurança jurídica e forçar que promotores, juízes e policiais optem por ficar tímidos e medrosos no combate ao crime. Nesse diapasão, percebe-se que o Brasil caminha no mesmo sentido da involução verificada na Itália, quando houve uma reação muito forte da classe corrupta ao trabalho eficaz e corajoso realizado pela Operação Mãos Limpas. Ademais, ao contrário do que se presenciou quando da mobilização nacional para que não passasse a PEC 37, que queria impedir o poder de investigação do Ministério Público, agora o que se tem é uma opinião pública anestesiada e assistindo passivamente a reação do crime organizado em nosso país. Onde está a lei que cria as 10 medidas contra a corrupção? Por que não tratar como prioridade a votação do projeto de lei anticrime? Onde está a valorização e a melhoria do aparato policial? Por que não investimos forte na retomada do controle dos presídios? Lamento muito que as respostas a essas perguntas (e a tantas outras) sejam colocadas de lado em um país que está contaminado pela corrupção sistêmica, que vive uma verdadeira “guerra civil”, em que se mata mais de 60 mil pessoas por ano e que é campeão supremo de roubos, furtos e tráfico de drogas. A corrupção reage, busca aniquilar o cidadão de bem, fazer o mal vencer, tudo na busca da satisfação de ideais mesquinhos de poder, fazendo sangrar ainda mais a sociedade, vítima do crime. Com essa medida, talvez nunca mais tenhamos uma nova “Operação Lava Jato”. Entretanto, como bom guerreiro ministerial, que doo o meu sangue à causa da Justiça todos os dias, mantenho a esperança de dias melhores em nosso amado Brasil.