Em plena véspera de Natal, enquanto as famílias, reunidas, celebravam a vida, o poder político nacional feria de morte a esperança de um país em reduzir o crime e a corrupção.
A lei do “Pacote Anticrime”, publicada em 24 de dezembro deste ano, que visa “aperfeiçoar” a legislação penal e processual penal, em verdade traz, em seu conteúdo, verdadeiras amarras praticamente invencíveis às instituições incumbidas de combater a criminalidade que assola o nosso país.
O projeto de lei, que fora encaminhado pelo Ministro Sérgio Moro à apreciação do Congresso Nacional, tinha um espírito, que era justamente tornar mais rígida a legislação criminal, com o objetivo de melhorar a investigação e o processo, bem como de reduzir a impunidade; contudo, novamente o projeto foi, propositalmente, deformado pelos legisladores (assim como já havia sido feito quando da votação da famigerada “lei de abuso de autoridade”), que incutiram institutos e exigências a fim de tornar o processo muito mais burocrático, moroso e altamente custoso para o Estado.
A invenção da vez foi o tal “Juiz de Garantias”, que prevê a exigência de dois juízes atuando no mesmo caso, ou seja, um juiz para a fase de investigação, o qual irá apreciar os pedidos de prisão e outras medidas de cunho cautelar, atuando até o recebimento da denúncia, e outro juiz que irá instruir e julgar o processo. O problema reside justamente no fato de que cerca de 40% das comarcas no país possui apenas um juiz. Portanto, a lei traz uma exigência praticamente impossível de ser atingida e altamente custosa para a sociedade.
E a justificativa para isso seria que o juiz que decide sobre as questões pré-processuais (investigação) ficaria contaminado para o processo e tendente a decidir contrário ao réu (ou seria “rei”?).
Como assim, contaminado? Todo juiz não é, por si só, um juiz que preza pelas garantias fundamentais previstas na Constituição? Todo Promotor não é, por si só, de “Justiça”? Já não existem recursos na legislação para questionar as decisões de prisão e cautelares? E o habeas corpus já não é “à vontade” da defesa?
Todavia, essa não foi a única “pérola” da novel legislação. Ainda há a previsão de que as provas produzidas na polícia não acompanhem o processo, o que prejudicará a produção probatória nas ações penais, bem como que o magistrado que receba a denúncia fique impedido de prosseguir no processo, o que já demonstra a total inconstitucionalidade do instituto do juiz de garantias, pois viola frontalmente os princípios do juiz natural e da inamovibilidade, pois lhe retira competência que já detinha.
Em verdade, nada é à toa. O objetivo é claro. A ideia é instituir o caos a fim de tornar o sistema de justiça cada vez mais inexequível e complexo, voltado a aniquilar operações de combate ao crime organizado no Brasil e à corrupção, assim como foi a Lava Jato.
Ficará quase impossível prender um corrupto preventivamente no Brasil. Será muito mais difícil o combate ao tráfico de drogas em nosso país. Os mais de sessenta mil homicídios por ano, além dos milhares de roubos e furtos (dentre outros tantos crimes), não foram suficientes para afastar da sanha egoística dos legisladores a sua “prioridade”, que é “livrar os seus pares”, ainda que isso implique mais derramamento de sangue do resto da população. E tudo isso com sanção presidencial.
O mal está vencendo, aos poucos. Lembremo-nos das palavras de Mougenot: “a noite não escurece de uma vez”.