Guilherme era um homem dito comum, de estatura mediana, discreto, pouco falante, concentrado em seu trabalho, sua vida era fazer cálculos. Trabalhava em uma empresa com vários contadores. Os colegas sabiam pouco de sua vida.
Algo acontecia todas as sextas, frequentava um lugar com uma pista de dança. E, aí, basicamente, ele se transformava em outra pessoa. Os hits eram ditos como antigos para muitos, mas aquilo era redenção para Guilherme. Uma atividade que nenhum dos seus colegas jamais pensaria que ele seria capaz, fugia de todo o perfil que externava no trabalho e sua rotina.
Reunião no escritório, tempo das declarações de renda, muitos documentos chegando dos clientes, a turma toda de contadores empenhados em cumprir os prazos. Roberta, para deixar as coisas mais leves na rotina, convida Marcela, Ricardo e Antônio para irem dar uma arejada num local engajado e dançante naquela sexta, para depois continuar no ritmo do trabalho.
Chegam ao ambiente iluminado, pista lotada, bebidas servidas no salão e comidinhas de boteco servidas no local que eram diferenciadas. Pediram uma mesa, se acomodaram, mas, sem ânimo para dançar, iriam somente ver o lugar e distrair a mente frente aos cálculos, planilhas e documentos que estavam deixando todos à flor da pele.
Nisso, Marcela chama a atenção dos demais: – Olhem, não estou acreditando! Lá na pista, quem está dançando!
Para surpresa dos demais, estava ele, dando um show com sua parceira, ao som de Always Remember Us This Way/remix. Eles jamais imaginariam isso. Estava irreconhecível, nem parecia aquele homem discreto e de poucas palavras que circulava no meio do escritório. Havia outro Guilherme, longe de tudo que eles viam diariamente.
Emendou mais três hits, sem parar, numa integração frenética, que o pessoal do escritório já batia palmas e assobiava. Guilherme nem os viu no local, estava focado era na dança e realmente ele e sua parceira davam um show.
Nisso, saíram e foram para uma mesa longe deles. Roberta não se conteve e disse aos demais: – Vamos lá falar com ele! O pessoal concordou.
Chegando, Guilherme parece que ficou envergonhado diante dos colegas, já que aquilo era seu refúgio e realmente ninguém do seu serviço sabia que adorava dançar. Antônio, o mais descontraído do grupo, acabou provocando o colega:
– Escondendo o jogo, todo quietinho no escritório, e agora temos um contador dançarino nas horas de folga, tipo um John Travolta daqueles filmes, tu sabe!
Ele respondeu: – Isso tenho comigo faz anos, sempre admirei muito esse lugar e um dia tomei coragem e entrei. Na terceira vez que vim não me aguentei e fui para a pista. Sabe, acho que fiquei uma pessoa melhor dançando mesmo.
À noite, foi criando um clima alegre entre os colegas de trabalho, que esqueceram um pouco a pilha de cálculos e de declarações que tinham de fazer. Segunda, lá estava Guilherme, irreconhecível, discreto, compenetrado no serviço. Os colegas o cumprimentaram, ele mais sorridente que de costume, os outros nem sabiam do escritório. Mas, aí virou uma turma cativa. Guilherme, Roberta, Marcela, Ricardo e
Antônio começaram a ir todas as sextas no mesmo lugar, primeiro mais tímidos que ele, depois já dando seus primeiros passos na pista de dança.
Numa destas sextas, terminado a saga das declarações de renda, o pessoal, mais que cansado de tanto que trabalharam, combinou de ir lá ao refúgio da empresa. A turma já estava mais integrada e solta, mas nunca tinham parado o pessoal olhando eles dançarem, basicamente isso era tarefa de Guilherme, que arrasava. O DJ naquela noite foi sábio, vendo um pessoal mais que animado ao som dos clássicos de Roupa Nova, Kid Abelha, RPM, resolveu incendiar o lugar colocando a cereja do bolo literalmente: Footloose. Melhor não perguntar o que aconteceu! O negócio é também irmos descobrir esse lugar. Vocês não acham?