A CASA VAZIA

Colunistas Geral

Ali só tinha silêncio, pouco mudava o cenário quando a televisão estava ligada. A casa era linda tudo muito organizado. O piso refletia a imagem de seus donos. Não havia sinal de poeira. Tudo parecia em perfeita ordem, mas no fundo escondia um caos.
Rodolfo e Simone eram casados há mais de vinte e cinco anos, uma rotina calculada de acordar, o café da manhã e cada um para seu ponto de trabalho, duas filhas adultas e mais duas netas pequenas. No curso do dia, eles pouco se viam. Então, eram nos jantares que colocavam o papo em dia.
Mas uma mania do casal era que até as visitas mais próximas e as filhas reparavam o excesso de limpeza. Quando alguém estranho chegava, eles gentilmente pediam: — Tire os sapatos, que passamos pano no chão há pouco!
E aquilo causava constrangimento e se tornava avesso à receptividade. Nisso contrataram Luíza para três vezes por semana intensificar a limpeza. Mas a guria estranhava tanto zelo com isso.
A vida daquele casal era diferente da vida de Luiza, era caprichosa, mas o tempo escasso tinha duas filhas e o marido, sua casa nem sempre em tanta ordem. Mas ali tinha cheiro de feijão novo, a mamadeira da menor, o pão no forno que fazia uma vez por semana. O café fresquinho passado que seu marido fazia e deixava uma xícara pronta para ela, com pão e margarina.
Era uma casa com movimento e vida, nada tão organizada. Tinha barulho, roupas por passar, os brinquedos espalhados na sala das gurias. As camas, às vezes, sem tempo de arrumar.
Só que, diferente dos seus patrões, pareciam muito felizes, os olhos daquela família não mentiam, refletiam o ar de união e cumplicidade, na simplicidade que era seu lar. E por isso a indignação dela, o casal tinha tudo, mas as manias estavam trazendo só escuridão para aquela casa que era cheia de tudo e parecia vazia. A paz não era descanso, era forçada, sem brinquedos, barulhos, no fundo sem vida.
Um dia resolveu se insurgir contra os patrões:

– Olha, faz pouco tempo que trabalho aqui e entendo o zelo que tem, mas esta casa está vazia!
Aquilo chocou Rodolfo e Simone pela sinceridade que viram na fala de Luíza.
— Vocês têm que se abrir a outras pessoas. Parece tudo organizado, mas o ambiente é triste. Sem direito a bagunça, outras pessoas rindo até discutindo, como uma casa real é de verdade!
Bom, virou as costas, foi para sua casa de três cômodos, o marido a questionou sobre seu olhar triste, chegou às filhas da escola e deu o jantar. Desconversou. E só disse:

– Acho que vou procurar outro emprego.
Depois de quinze dias, uma ligação inesperada era Simone chamando Luíza para conversar. E ela foi louca de medo.
Simone disse: — Aquele dia não esperava tanta sinceridade. Obrigada, Luíza, eu e o Rodolfo não vimos nosso excesso de manias. E isso estava realmente nos afastando da família e dos amigos. Só preciso de ti, a nossa neta menor, Roberta, pintou tudo a parede do nosso quarto.
Aquilo virou de choro de emoção a riso das duas diante da obra de arte da pequena. Ali nasceu, além de uma confiança genuína, uma amizade sincera para a vida toda daqueles patrões e sua empregada, que agora ficou sendo parte daquela família. Por fim, agora, uma casa que antes era vazia, agora cheia de sentimentos e presença além dos seus donos que ali habitavam!

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