Paulo já havia passado por poucas e boas. Acreditava que o melhor caminho na idade em que se encontrava era ficar sozinho. Tinha três casamentos, muitos namoros, dois filhos crescidos e criados. Dizia que já havia pendurado suas chuteiras. Não queria nenhuma mulher no seu pé, fazendo cobranças ou mudando a forma como vivia.
Na verdade, ainda tinha um comportamento de menino, embora beirando a casa dos sessenta. Sua última separação foi conflituosa, um casamento tido como perfeito socialmente, muitos likes, redes sociais bombando, viviam uma relação perfeita sob os holofotes, mas não se tinha mais conversas francas quando realmente se viam sozinhos. Deste casamento que lhe rendeu o casal de filhos: Estela e Pedro. Ela formada em engenharia, o guri recém estava começando a atender pacientes como psicólogo. Casado com Sofia, ajeitou tudo antes de juntar as escovas de dentes. Mas até o melhor dos planejamentos não tem poder de suportar a realidade de vidas e mentes que têm objetivos diferenciados.
Paulo queria sossego, nada de vida pública e veiculada em redes sociais, já Sofia só via magia na união com postagens e isso destoava no casamento dos dois. Deram tudo aos filhos, nunca faltou nada, talvez essa tenha sido a ponta do iceberg que congelou de vez seu amor tão indestrutível que tinha por Sofia. Ela, uma parceira obstinada, coordenadora de uma área de investimentos, era um lince nos negócios. E, no fundo, Paulo se acomodou no seu serviço e não gostava tanto da forma com que a mulher agia, em que a parte profissional se misturava com a privada. E não tinha tempo para a família, nem mais tomarem café juntos, algo que nos primeiros dez anos de casados era fato prioritário. Almoçavam somente aos domingos e jantar era algo que não existia naquela imensa casa. As duas primeiras uniões foram curtas e também não foram tranquilas, com muitas discussões patrimoniais, mas estava cansado daquela situação, embora soubesse muito bem como se dava uma separação. Aparentemente civilizados e ordeiros, procuraram o divórcio de forma amigável que durou algumas semanas, mas ainda sofreram alguns conflitos na partilha dos bens. Logo estavam livres e apenas em comum tinham os filhos da união.
Paulo se vê numa situação que jamais teve durante seus quase sessenta anos, a verdadeira sensação de solidão. Algo que nem quando era adolescente, cercado da família, amigos e algumas paqueras. Ali estava escrevendo um novo capítulo da sua história, só que com novos desafios.
Um amigo que há pouco tinha se separado, o Ciro, tentava demover Paulo da decisão de ficar sozinho. Personalidade diferente do amigo, ele era baladeiro, de quinta emendar até domingo. E queria que o Paulo, agora novamente solteiro, voltasse aos tempos em que eles fizeram faculdade juntos. Começou a querer apresentar umas amigas, marcar algumas baladas e também levar a pubs, que assim o amigo voltaria no que achava ser ideal para o novo divorciado.
Depois de duas semanas sem querer viver a onda do amigo, ele teve uma conversa franca: – Ciro, eu sou um homem, não posso mais ficar agindo igual a um menino! Essa vida de balada não faz mais parte do meu estilo de vida! E Ciro achou uma grande besteira de Paulo ficar isolado e não cair na noite igual ele vinha fazendo. Mas respeitou a decisão do amigo. Na verdade, só se reuniam no dia do futebol. Passou o tempo, Paulo soube que Sofia tocou sua vida, estava de namoro sério com um velho amigo dos dois, ficou aborrecido, mas não estava mais conectado com o estilo de vida da ex-mulher.
Um belo dia, foi à loja de costume que dava assistência de informática do seu escritório, para que enchessem o cartucho da sua impressora, mas sem tempo deixou para pegar no outro dia. Quase esquecendo, retorna à loja, uma moça sorridente que nunca tinha visto naquele local, procura o cartucho e não acha. Eles começam a conversar sobre outras coisas, ela fala que chegou há pouco naquela cidade e o emprego é novo, entrega o cartucho ele agradece.
Nunca Paulo mandou tantos equipamentos do seu escritório para conserto. Já estava ficando estranho e ia pessoalmente buscar e conversar com Marília. Ele era um homem, mas tinha voltado a ficar igual a um menino. Não tinha mais nada que tirasse aquela moça dos seus pensamentos.
Um dia, uma visita inesperada. Pedro vai tirar um tempo na casa do pai. Nota algumas diferenças e faz perguntas, e ele confessa ao filho que estava apaixonado novamente por uma mulher. Mas não tinha entrada para convidá-la para sair. Pedro fala sem rodeios ao pai: – Tu estás com medo de levar um fora! Convida essa mulher para sair! Olha teu histórico, pai! Nem estou te reconhecendo!
Encorajado pelo filho, vai à loja mais uma vez, pede um orçamento e fica um tempão de papo com a Marília. Quase indo embora, mais uma vez no zero a zero. Toma a iniciativa: – Olha, já estou ficando sem jeito. Venho aqui muitas vezes e, no fundo, estou tentando achar oportunidade de te convidar para sair!
E ela: – Eu já tinha visto, até que enfim tu fizeste o convite! Saímos, sim, como amigos. Marca local e hora e conversamos.
Aquilo, como amigos, foi como um balde de água fria. Mas, um sim já era meio caminho andado. Para piorar a situação e atrasar sua vida, Ciro resolveu chegar com uma caixa térmica lotada de cervejas, já ligando a televisão que hoje tinha clássico do futebol, falando de suas últimas conquistas amorosas. Ele, sem muita paciência, o expulsou de casa. E antes descarregou: – Olha, Ciro, tu pega geral, eu já passei desta fase! Somos amigos! Mas esse tipo de vida não é mais a minha. Tu é um homem, mas age igual a um menino! Não me leve a mal: vai embora que hoje tenho um compromisso!
E voltou para se arrumar. Marília disse 21h em ponto. E chegou quinze minutos antes, contando os segundos para que ela chegasse, nisso de sorriso largo, roupa simples, simpática com o garçom que indicou a mesa em que ele estava, quando era quase 13h da manhã e o dono do restaurante disse que tinha de fechar e eles saírem.
Depois disso, de um tempo saindo, sem o Ciro intervindo naquela relação, Paulo passou a viver com Marília com muito amor, cumplicidade, respeito e conversa. Paulo não agia mais como um menino. Demorou, mas o tempo de viver o extraordinário chegou para os dois!
