Chimarrão e bergamotas

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Época boa e Suzana sabia disso, num frio de inverno de julho, para parar tudo que estivesse fazendo e, no entardecer, pegar seu chimarrão e uma sacola com bergamotas e esperar o sol se pôr lentamente.
Sua rotina era muito cheia de compromissos, melhor era nem olhar para o relógio, de tantas atividades que se via envolvida, senão ela ficava automaticamente estressada. Quando acordava, nem o galo havia cantado, tomava um café no copo e fazia um pão prensado às pressas com margarina. Pagava à condução que a levaria ao seu serviço. E, para dormir, seu horário era quase meia-noite.
Era cozinheira de um restaurante muito movimentado no centro de sua cidade, ali o serviço era direto: almoço e jantar, além de terem de servir as quentinhas. E, no setor em que trabalhava, tinha mais duas auxiliares na cozinha e o chefe principal que coordenava a equipe, ao qual ela era o seu braço direito.
O restaurante era elogiadíssimo, uma comida simples, mas feita a capricho, variada e servida de forma farta. A fila de clientes que disputavam um lugar, principalmente ao meio- dia, já que para todos era inviável voltar para casa e fazer almoço, era um ponto de muito movimento.
Suzana queria uma folga, um descanso mais prolongado, para tomar seu chimarrão acompanhado de bergamotas, sem qualquer compromisso, e ver o sol se pôr. Isso era seu costume quando era adolescente e ela, junto de suas amigas: Karen e Marta, seguiam de bicicleta e chegavam a um mirante. Levavam o chimarrão e uma sacola cheia de bergamotas, na época de colheita desta fruta. E esperavam o sol se pôr, ouvindo as músicas daquele tempo, num rádio portátil a pilha.
Neste final de semana, embora tivesse seus compromissos com o restaurante, foi ao mercado abastecer sua despensa e deu de cara com um cesto cheio de bergamotas à venda e pegou algumas. Embora achasse literalmente que o tempo era escasso, não daria direito a ter esse ritual.
Suzana observou seu serviço, comunicou ao Chefe que precisava sair mais cedo, organizou o jantar do restaurante e instruiu suas colegas de função e se deu o direito de fazer o contrário da sua rotina frenética. Fez um chimarrão a capricho, ligou para Karen, que tinha duas filhas moças, e Marta, que tinha um filho adolescente. E reivindicou: – Gurias, tenho um programa especial para nós neste findi! Peguem as bicicletas e venham aqui em casa. Espero hoje às cinco horas da tarde!
Isso despertou a curiosidade das amigas, que deram um jeito e chegaram à casa de Suzana. Surge ela com um rádio, uma sacola de bergamotas e chimarrão. Elas se olharam e somente sorriram, já sabiam o destino. E após vinte anos, novamente as amigas no mirante se viram ouvindo músicas que tocavam no rádio, comendo bergamotas e tomando chimarrão, assistindo mais uma vez ao pôr do sol.
Suzana voltou diferente para o restaurante na segunda. Seu chefe até elogiou seus pratos, desde esta saída que regressou aos tempos de sua adolescência. Desde então, criou um hábito com suas amigas, por vezes saídas ao mirante, noutras uma roda de café em algum lugar de onde queriam sair, outras um jantar na casa de cada uma.
Os respiros eram necessários e cada vez mais frequentes na vida de Suzana. Mas seriam certamente os mais especiais, quando se dava o direito de novamente ir àquele mirante assistir ao pôr do sol, levando um bom chimarrão e bergamotas e quando suas amigas estavam por perto!

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