Pés na areia do mar

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Chegada à temporada de férias de verão, um sonho de Rafaela é colocar os pés na areia do mar. Os obstáculos do caminho: pouco dinheiro e vivia distante de qualquer praia, no mínimo cinco horas de viagem. E como seu orçamento era apertado, tinha suas responsabilidades: aluguel, água, luz, telefone, os mantimentos, fora roupas e despesas extras, nunca sobrava para juntar nem fosse para passar um período curto na beira do mar.
Rafaela, quando seus amigos perguntavam aonde queria ir para descansar, não fugia do tema, conhecer o mar de perto e colocar seus pés na areia. Falava de uma lembrança sua da infância, um balde com pazinha e brinquedos que sua tia Sônia dera num final de ano. E o máximo que utilizava era na pracinha próxima de casa e junto à piscina que a mãe montava para ela e seus irmãos brincarem.
Cresceu com aquele desejo de tirar férias numa praia e, neste ano, fez algo inusitado, resolveu fazer uma restrição, tinha o costume de antes ir para o trabalho, passar numa padaria de seu bairro, tomar um café, pedir um pão e às vezes até um doce para acompanhar. Aquilo ajudava, porque o seu trabalho era bem puxado, tinha o almoço que serviam e um café da tarde aos funcionários, voltava sempre às 21 horas e muito cansada. 
Mas, a pequena despesa do café, que girava em torno de uns R$ 10,00 de segunda a sábado, poderia facilitar a realização de seu sonho. E resolveu economizar estes R$ 240,00 mensais, que, no fundo, nem prestava atenção, já que era uma necessidade estar bem alimentada para enfrentar seu dia de trabalho, o qual era na linha de montagem de uma empresa grande na sua cidade. Dentro daquelas paredes, restringia seu mundo de segunda a sábado.
Dez meses passados, desde que entrara naquele propósito, já achou que teria um dinheiro suficiente para passar, nem que fossem poucos dias numa praia próxima. Encontrara uma agência com um pacote acessível, pediu referências e comprou aquele destino. Rafaela nem escondia a felicidade, ajeitara sua mala, nas suas férias que começariam daqui a quinze dias.  Foi normalmente para o trabalho, no mesmo propósito, sem café na Padaria, mas algo aconteceu, seu Chefe da Sessão a chamara às pressas no RH da empresa. Maria lhe comunicou que, como a colega Giovana teve de sair de licença, porque a mãe estava hospitalizada, suas férias teriam de ser adiadas, já que na linha de montagem era
Rafaela uma das melhores funcionárias. Aquilo foi como um banho de água fria nos planos dela, será que a empresa do pacote de viagens conseguiria remarcar sua viagem, perderia seu investimento e, o pior, quando de fato conheceria o mar?
Acatara a decisão de sua chefe do RH, o emprego sempre foi sua prioridade, nem entrara no mérito de que tinha planos para suas férias e saiu aquele dia do trabalho completamente desmotivada. Chegara a casa, vira sua mala, os planos, os sacrifícios que estava fazendo para juntar cada centavo para a viagem que seria da sua vida e não aguentou, começou a chorar.
Nisso, toca o telefone, atende com voz desmotivada. No outro lado da linha, sua mãe, Sandra, do interior, perguntando como ela estava, estranhou seu jeito e logo lhe fez uma pergunta direta: – O que houve contigo, filha? Tua voz está estranha, parece triste?
Meio sem jeito, responde e explica à sua mãe o que aconteceu. E logo sua mãe responde: – Tudo na vida, filha, tem um jeito, só não tem para a morte. Fale com esta empresa de viagem ou pense em alguém que te substitua. E diz para tua chefe o sacrifício que está fazendo por esta viagem. Sei que tu sonhas em conhecer o mar desde pequena! Vou te ligar novamente para ver o que tu resolveste! Beijos e fica com Deus!
Rafaela ficara mais animada, sua mãe sempre a colocava para cima. E tomou coragem, primeiro para a empresa de viagem, explicou tudo que aconteceu, eles disseram que não poderiam devolver todo o dinheiro do pacote, transferir a data ficaria complicado. Aí veio a parte mais difícil, recorrer mesmo à sua chefe do RH. 
No outro dia, Rafaela vai ao serviço, pede licença no seu setor, fica mais de trinta minutos aguardando a chefe que estava despachando vários problemas da empresa. E ela questiona: – O que faz aqui, Rafaela? Já não estava tudo certo? Ela responde: – Infelizmente, não. Não vou poder ceder minhas férias. Vai ter que pedir para outra pessoa substituir Giovana ou me mandar embora! E aquilo impactou sua chefe. Que a questionara novamente: – Mas, o que de fato tu não podes substituir a Giovana? Rafaela explicou que tinha um sonho desde pequena: conhecer o mar, feito um sacrifício, que até tentou demover a empresa de viagem e foram irredutíveis. E gostava muito do trabalho, mas não tinha outra oportunidade no momento de fazer esta viagem noutros tempos.
A sinceridade de Rafaela tocou sua chefe, que era conhecida como uma pessoa difícil de lidar e irredutível em suas decisões na empresa. Saiu da sala, sem resposta alguma, só o que ela disse: “Vou pensar no teu caso, depois te comunico o que vou fazer.”
O jeito era Rafaela confiar nas palavras de sua mãe, se fosse para seu bem, tudo se ajeitaria. Já nem olhava para sua mala com aquela alegria toda e, passado uma semana, nada de retorno da chefe e nem poderia cancelar a viagem e perder parte do seu investimento.
Dois dias antes de entrar em férias, não sabia se de fato continuaria para substituir Giovana, o chefe do seu setor lhe entrega uma carta. Pensou: Deve ser a minha demissão, aquela mulher, ninguém consegue agradar ela, nem sendo a melhor no serviço. Onde eu estava com a cabeça para desafiá-la desse jeito? E quando eu pensei que poderia, nas condições apertadas em que vivo sair de férias para ver o mar!
Abre, tremendo de medo, começa a ler, o chefe do setor lhe questiona: – Tu estás bem? Que tal um copo d’água? Ela chora e ri ao mesmo tempo. Responde: – Não, tudo certo. Obrigada, Deus! Até que em fim!
Na carta: «Sra. Rafaela, olhamos nosso cadastro, é funcionária da empresa há vários anos.» Sempre pontual, já substituiu vários de seus colegas. Estamos lhe dando um bônus de gratificação nestas suas férias. Aproveite e volte com força total para seu setor. Inclusive, lhe comunicamos que será empossada como a nova chefe da linha de montagem. Boas férias! 
Assinado.
Maria (Chefe do Setor RH)
Dias se passaram, agora o cenário é outro: De chapéu, uma canga na cintura, chinelos nas mãos, uma sacola com protetor, bloqueador e uma garrafa d’água, o Sol queimando seu rosto. Por todos os lados que olhava, uma imensidão de água.
Pensa consigo: Depois de todos os sacrifícios que fiz, as dificuldades, o tempo que levei, mas agora estou aqui com os meus pés na areia de frente para o mar! Coisa linda! Obrigada, meu Deus! 
E lá estava Rafaela, depois de muitos anos só em sonho, agora finalmente podendo conhecer o Mar!

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