CCJT RECEBE ESCRITURAS ORIGINAIS DE MOVIMENTAÇÃO DE MÃO DE OBRA ESCRAVA EM CAÇAPAVA DO SUL

Caçapava do Sul Cultura Destaque Geral

A Casa de Cultura Teixeira (CCJT) recebeu uma série de documentos da família do pecuarista Boaventura Vicente Machado que registram a movimentação de escravos em sua propriedade, no período de 1870-1890. O material está na caligrafia da época e inclui comprovantes de compra, venda e registros de escravos, além de duas cartas de liberdade. “Com essa doação, a ideia é contribuir para o resgate da história e evitar que os documentos como estes acabem numa fogueira”, diz Cândida Feliza dos Santos, bisneta do fazendeiro e que guardou esses papéis por tantos anos.
Um dos documentos recebidos pela CCJT é uma “matrícula geral”, lista exigida pelo Império brasileiro aos proprietários de escravos, onde constava nome, sexo, idade, estado, aptidão para o trabalho e filiação de cada um, caso conhecida. Os proprietários que não faziam o registro dos cativos ficavam sujeitos a uma multa de 200 mil-réis.
No total, Boaventura teve quatro escravos. Três que constavam no registro geral e um quarto averbado mais tarde. Lourenço (31 anos, cor preta), Cytena (mulher, 16 anos, cor parda), Cyriaco (de 9 anos, cor preta) e Hilario. Ao que tudo indica, a criança trabalhou na fazenda até os 25 anos, alforriado aos 21 em 1884 e obrigado a trabalhar gratuitamente mais quatro. Hilario teve a liberdade concedida em 1887.
Segundo o historiador João Esmerio Timotheo Machado, o fato das cartas de alforria terem data anterior a abolição “oficial” da escravatura no Brasil, em 1888, isso pode ter sido resultado da “jornada abolicionista” – um importante movimento popular que se opunha a escravidão – ocorrido em Porto Alegre de 12 a 18 de agosto de 1884 e depois disseminado por todo Estado do Rio Grande do Sul.
O Centro Abolicionista de Porto Alegre criou comissões de libertação e, junto com a população, percorreu a cidade para persuadir os donos de escravos urbanos a libertarem seus cativos. Na primeira semana de setembro de 1884, Porto Alegre foi declarada “cidade livre”, quase quatro anos antes da abolição nacional. “Foi feito um compromisso político para emancipar os escravos na Província, concedendo-lhes emancipação condicional, o que permitiu que os senhores utilizassem o trabalho de seus antigos escravos ainda por alguns anos, como forma de ressarcimento”.
Ter escravos nesta região não era exclusividade dos grandes fazendeiros. De acordo com André do Nascimento Corrêa, autor da tese de mestrado de mestrado titulada Ao Sul do Brasil Oitocentista: escravidão e estrutura agrária em Caçapava, 1821-1850, “adquiriam escravos também médios e pequenos pecuaristas, assim como, agricultores, lavradores dentre outros. Talvez, para estes habitantes, fosse mais fácil adquirir no mínimo um escravo do que pagar pelo serviço de peões livres”.

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